“The only investors who shouldn’t diversify are those who are right 100% of the time”
Sir John Templeton
A ideia da diversificação é uma das mais poderosas no campo das finanças e como costuma-se dizer o único “almoço grátis” disponível para os investidores.
Essa ideia, vencedora de um Prêmio Nobel, é a pedra fundamental de muitos dos serviços financeiros que nos ajudam a lidar com os riscos e incertezas do mundo, desde a época das grandes navegações até os seguros de carro, de vida, e, principalmente, no mundo dos investimentos. Ela é oriunda das raízes da estatística: enquanto os riscos individuais independentes são praticamente imprevisíveis, mas a frequência com que esses riscos tendem a ocorrer em uma grande população é amplamente previsível. Nunca sabemos se nos envolvemos em um acidente de carro ao dirigir numa estrada, mas o número total de acidentes desse tipo em um determinado mês em uma região é muito mais previsível.
Esse fato científico abre as portas para uma das ideias mais fascinantes nas finanças: o compartilhamento de riscos, ou seja, a ideia de que podemos nos proteger do impacto potencialmente devastador dos riscos individuais ao agrupá-los e compartilhar seus custos com os outros.
O compartilhamento de riscos se torna um grande aliado do investidor, pois consegue oferecer uma base sólida de atuação no meio de todas as incertezas existentes, transformando uma ideia abstrata do campo da estatística para o mundo real “dia a dia”. Ao diversificar nossos investimentos, estamos reduzindo a exposição a riscos específicos de empresas ou mercados, e ampliando nossas chances de obter retornos consistentes ao longo do tempo.
Nesse aspecto, ter um portfólio diversificado ao longo da sua vida é buscar colocar as chances ao seu favor, é buscar ter uma taxa de retorno estável e consistente para se manter “vivo” na dura jornada de construção de patrimônio e, além disso, reduzir a carga de ansiedade que seria ter grande parte das suas economias investidas em uma única empresa ou título.
Os mercados são imprevisíveis
Atualmente, o ato de investir é cada vez mais complexo, temos uma infinidade de produtos, opções e mercados para escolher, como ações, fundos de investimentos, títulos de renda fixa, moedas e criptomoedas, e tão logo acabamos esbarrando na famosa pergunta: qual investimento terá a melhor rentabilidade?
A resposta deveria ser um sonoro: eu não sei, afinal, é impossível ter essa resposta.
Novamente a diversificação se apresenta como uma aliada ao investidor, pois como diria o prêmio Nobel de física Niels Bohr1: “previsões são muito difíceis, especialmente sobre o futuro”, e se tratando de previsões de séries financeiras, mais difícil ainda.
A impossibilidade de cravar a real rentabilidade para o futuro de qualquer produto financeiro advém do fato de que existe uma interação complexa num nível gigantesco de novas informações que chegam todos os dias, como divulgação de resultados de empresas, dados econômicos, decisões de bancos centrais, percepção de risco dos investidores, redes sociais e etc, tudo isso de forma simultânea e, por vezes, gerando sinais contraditórios.
Vamos tomar como exemplo a tabela abaixo, que mede e ordena o resultado anual dos principais mercados brasileiros e internacionais desde 2008. Veja como ano após ano a primeira posição é alcançada por diferentes mercados, sendo que em muitas das vezes o melhor mercado de um ano é o pior mercado do ano seguinte, ou o inverso, o pior mercado de um ano é o melhor do ano seguinte.
Existe uma aleatoriedade presente que é fruto de toda a incerteza e por isso que buscar o “melhor investimento do momento” pode ser uma tarefa inglória e sem uma resposta. Nesse sentido, a diversificação se apresenta como uma forma de você ter um portfólio preparado para os diversos cenários – os bons, os excelentes e os difíceis – em qualquer momento.
Ter um portfólio que possui pelo menos uma parte em todos os grandes mercados te garante uma participação estável em todas as tendências e reduz o seu risco como um todo. Um portfólio bem diversificado é aquele que responde pelas amplas oscilações de desempenho dentro das classes de ativos, onde a diversificação permitirá a captura do retorno positivo das classes de ativos com bom desempenho e evitará que você esteja totalmente investido naquelas que não apresentam bom desempenho.
É tudo sobre equilíbrio
O primeiro passo ao se pensar em um portfólio diversificado é entender quais são seus objetivos, entender exatamente qual é o seu real propósito com aquele montante financeiro e como você usará a combinação de ativos ao seu favor para alcançá-lo. Isso lhe trará uma visão mais clara de quais são suas alavancas e restrições, qual é o seu prazo, qual a sua necessidade de liquidez e principalmente sua capacidade de correr riscos.
Após a boa definição do seu objetivo, chegamos na que é a considerada a decisão mais importante para o resultado de qualquer portfólio, qual será a sua composição das classes de ativos, ou em inglês: qual será seu asset allocation.
Segundo o importante estudo publicado em meados de 1986 chamado de Determinants of Portfolio Performance2, onde a partir de uma extensiva análise de retornos de mais de 10 anos dos maiores fundos de pensão americanos, chegou-se a conclusão de que mais de 93% do padrão de retorno das carteiras tinha como explicação um único fator: o peso escolhido para cada mercado investido, ou seja, o asset allocation.
Esse estudo foi replicado centena de vezes, seja para fundos de pensão, fundos tradicionais, carteiras de investidores e também outras geografias, mantendo sempre o mesmo diagnóstico: a sua principal decisão é definir qual será a combinação entre as classes de ativos (asset allocation), sendo essa decisão muito mais importante e determinante para o longo prazo do que tentar “comprar e vender na hora certa”, o que chamamos de timing, ou mesmo de tentar selecionar aquela ação ganhadora do momento, o que chamamos de security selection.
No gráfico abaixo, mostramos um exemplo prático dessa relação usando duas classes de ativos – ações americanas (RV) e a renda fixa brasileira (RF) – para demonstrar o impacto da alocação de ativos tanto nos retornos médio acumulado quanto na variabilidade dos retornos.
Os números na linha cinza central do gráfico mostram o retorno médio anual desde 2007 para várias combinações de portfólios com renda fixa e renda variável, na sequência temos as barras representam os melhores e piores retornos para uma janela de 12 meses para todo o período.
Podemos tirar diversas conclusões com esse gráfico, mas visualmente já podemos perceber que um investidor que mantém uma carteira alocada em 20% em ações dos EUA pode esperar um resultado muito diferente de um investidor com 80% alocado em ações.
Adicionalmente, o gráfico também demonstra o risco de curto prazo de possuir ações: um portfólio com metade de seus ativos em ações teria perdido mais de 16% de seu valor total em pelo menos um ano. Por que não simplesmente minimizar a possibilidade de perda e financiar todos os objetivos usando investimentos de baixo risco?
Porque a tentativa de escapar da volatilidade do mercado associada aos investimentos em ações, investindo em ativos mais estáveis como os títulos de renda fixa, pode expor um portfólio a outros riscos de longo prazo.
Um desses riscos é o “custo de oportunidade”, como a carteira carece de investimentos que apresentem maior potencial de retorno, ela pode não alcançar um crescimento suficiente para financiar seus objetivos ao longo prazo. Por vezes, o maior risco é não tomar riscos. Por isso um componente de renda variável muitas se faz necessário.
Na prática, a diversificação é uma ferramenta poderosa de gerenciamento de riscos e é uma aplicação rigorosamente testada do bom senso: os mercados frequentemente se comportam de maneira diferente uns dos outros – às vezes marginalmente, às vezes significativamente – em qualquer momento dado. Possuir uma carteira com pelo menos alguma exposição a muitas ou todas as principais componentes do mercado garante ao investidor uma participação em áreas mais fortes, ao mesmo tempo em que ameniza o impacto de áreas mais fracas.
[1] Niels Henrik David Bohr foi um físico e filósofo dinamarquês que fez contribuições fundamentais para a compreensão da estrutura atômica e da mecânica quântica, pela qual recebeu o Prêmio Nobel de Física em 1922