A estratégia de selecionar empresas para compor uma carteira de ações de acordo com sua capacidade de pagamento de dividendos é provavelmente um dos métodos mais conhecidos entre os investidores. Do pequeno investidor pessoa física que busca rentabilizar seu capital aos globais fundos de pensão com bilhões de dólares para investir, essa estratégia é conhecida como um método eficaz para tomar decisões de investimentos.
Os primeiros a defenderem o fluxo de dividendos como critério de seleção de ações foram Graham e Dodd, dois expoentes da Tradicional Teoria de Portfólios, no início da década de 19301. Uma das estratégias desenvolvidas a partir de então foi a seleção de ações por meio das taxas de retorno em dividendos de uma ação, doravante denominada dividend yield.
Selecionar empresas pagadoras de dividendos pode ser considerada uma boa estratégia por vários motivos, vamos elencar alguns deles:
Usando como parâmetro os tópicos listados acima, podemos olhar para o mercado brasileiro e americano para buscar empresas que atendam a esses critérios para montar uma carteira de ações saudável e rentável ao longo do tempo.
Dividendos no índice Bovespa e S&P 500
O índice Bovespa é o índice mais antigo e tradicional do mercado financeiro brasileiro, ele foi desenvolvido em 1968 pela Bolsa de Valores de São Paulo2, o objetivo do índice era criar uma referência para medir o desempenho do mercado acionário brasileiro como um todo. Inicialmente composto por 18 ações, o Ibovespa começou sua trajetória com um nível base de 100 pontos. Ao longo dos anos, o índice passou por diversas mudanças, acompanhando a evolução do mercado financeiro brasileiro. Hoje, o Ibovespa representa cerca de 80% do volume financeiro negociado na B3, a bolsa do Brasil, e é reconhecido como um dos principais indicadores de desempenho das ações listadas no mercado brasileiro. Do outro lado, temos o S&P 500, que é o índice de ações mais conhecido e investido do mundo, composto pelas empresas da economia mais pujante do planeta.
Naturalmente o Ibovespa e o S&P 500 são repletos de grandes empresas pagadoras de dividendos. Recorrentemente as empresas que compõem o índice fazem pagamento de dividendos aos seus acionistas e esses valores são reinvestidos na própria carteira do índice para acumular maior retorno ao longo do tempo. Esse é o tipo de índice que chamamos de “total return“. Neste tipo de índice, ao analisar seus resultados acumulados em uma determinada janela, você estará levando em consideração também os dividendos pagos e reinvestidos.
Contudo, existe uma outra forma de analisar o retorno de um índice, que é considerando que os dividendos teriam sidos retirados ao longo do tempo e o índice refletiria apenas a valorização do preços das ações, ou seja, apenas o ganho de capital acumulado.
Vamos olhar para esses dois métodos do índice Bovespa e do S&P 500:
Fonte: B3 Índices e Bloomberg, produção Nu Asset Management
No caso do Ibovespa, em uma janela de mais de 13 anos, desde 2010, quando retiramos o efeito do reinvestimento dos dividendos no índice o seu retorno é negativo, da ordem de -14% no período. Isso demonstra a importância do fator dividendos para o índice e também questões estruturais da eficiência de alocação no mercado brasileiro.
Esse fenômeno tem como uma de suas possíveis explicações o fato de que o “prêmio de risco“3 para se investir em ações no Brasil é mal remunerado, ou seja, o investidor que sai do conforto da renda fixa para buscar retornos adicionais na renda variável, na média, não teve um retorno condizente que justificasse o risco incorrido.
Uma série de pesquisas e estudos já foram feitos para provar tal ponto, podemos tomar como evidência os números disponibilizados pelo Núcleo de Pesquisa em Economia Financeira da USP, no qual é calculado prêmio de risco histórico do fator mercado para o mercado brasileiro, o valor encontrado é de apenas 0.84% acima da taxa de juros ao ano desde 20014. Se decidirmos olhar especificamente para o fator tamanho (que seria equivalente a empresas de baixa capitalização comumente chamadas de small caps) esse fator chega a ser negativo, da ordem de -1.4% ao ano.
No caso americano, a situação é completamente diferente, o retorno do índice total return foi de +269%, onde +186% é oriundo do ganho de capital e +82% vieram de reinvestimento dos dividendos recebidos. Portanto, apenas 30% do retorno do índice é oriundo do reinvestimento dos dividendos, demonstrado como a alocação de capital é mais eficiente e o ganho de capital é efetivo.
Para fins de comparação o famoso professor de valuation Aswath Damodaran calcula recorrentemente o prêmio de risco do mercado americano e mensura que esse valor está sempre entre 4% a 6% dependendo do regime de mercado5, demonstrando como em um mercado desenvolvido os investidores são melhor remunerados para os riscos incorridos.
Isso quer dizer então não faz sentido investir em ações no Brasil? Não necessariamente.
A conclusão mais evidente é que para investir em ações no Brasil é preciso um cuidado maior para selecionar melhor as empresas de qualidade, aquelas que apresentam histórico de lucratividade, crescimento e liderança no setor. Nesse sentido, empresas pagadoras de dividendos por possuírem fluxos financeiros e lucratividade saudável se enquadram nesse filtro de qualidade e a boa notícia é que podemos encontrá-las dentro do próprio índice Bovespa.
O que é um índice Smart Beta
O mercado internacional de ETFs é enorme, segundo os últimos dados disponíveis no site da consultoria ETFGI ETF/ETP6, o volume total nesse tipo de produto alcançou o montante de 10.6 trilhões de dólares esse ano, com mais de 9 mil ETFs listados em bolsas ao redor do globo. Nesse sentido, o mercado de ETFs ao redor do mundo é muito mais desenvolvido o que naturalmente acarreta também na evolução da sofisticação dos índices disponíveis. Uma das principais inovações dos últimos anos foi o desenvolvimento do conceito de índices smart-betas.
Smart beta é o nome dado a um índice que é criado a partir de um outro índice, ou seja, existe um processo que busca explorar e aprimorar certos fatores de desempenho na tentativa de superar um índice de referência. Tal estratégia procura aumentar os retornos, melhorar a diversificação e reduzir o risco (aumentar o sharpe realizado), afinal índices não são encontrados prontos na natureza, são produções humanas passíveis de aprimoramento. Tudo feito com regras muito claras, passíveis de replicação e transparência, buscando assim unir o melhor dos dois mundos: da gestão passiva e da gestão ativa.
Diversos ETFs que seguem índices smart betas estão disponíveis no mercado desenvolvido, índices como S&P 500 foram otimizados buscando extrair diversos fatores, como o de baixa volatilidade, dividendos, tamanho, fundamentalista e etc, todos disponíveis amplamente aos investidores.
No caso do mercado brasileiro, ainda não possuímos uma vasta quantidade de ETFs que seguem índices smart-betas, e principalmente: ainda não existiam índices smarts que possuíam como índice originário o próprio índice Bovespa, buscando propor um aprimoramento.
O índice Bovespa Smart Dividendos
Como pudemos observar no gráfico acima, a importância dos dividendos dentro do índice Bovespa ao longo do tempo é significativa. Essa é uma forte evidência de que existe um fator passível de ser extraído, sistematizado e replicado em uma estratégia.
Nesse sentido, a área de índices da B3 decidiu dedicar esforços para criar um índice que explorasse tal fator de forma explícita, transparente e que selecionasse as grandes empresas pagadoras de dividendos do mercado brasileiro. Vamos entender com mais detalhes cada etapa do processo de construção do Índice Bovespa Smart Dividendos.
Esse processo é repetido quadrimestralmente, no mesmo período de rebalanceamento do índice Bovespa, para gerar uma nova carteira teórica do Índice Bovespa Smart Dividendos. Como comentado, repetindo tal processo desde 2007 até a data mais recente de 2023, o resultado abaixo é verificado.
Fonte: B3 Índices, produção Nu Asset Management
Esse processo é repetido quadrimestralmente, no mesmo período de rebalanceamento do índice Bovespa, para gerar uma nova carteira teórica do Índice Bovespa Smart Dividendos. Como comentado, repetindo tal processo desde 2007 até a data mais recente de 2023, o resultado abaixo é verificado.
É possível verificar que o índice Bovespa Smart Dividendos superou o índice Bovespa em 55%, (lembrando que essa simulação não considera custos e taxas para nenhum dos índices), apresentando retorno acumulado de 142% nessa janela frente ao 87% do Ibovespa. Além disso, é possível verificar que tal rentabilidade é consistentemente acima do Ibovespa, evidenciando que o fator de dividendos foi extraído e apropriado pelo índice ao longo de toda a janela, oferecendo uma otimização ao índice original do Ibovespa, ou seja, um smart-beta de fato.
Do ponto de vista dos nomes de empresas que contribuíram para esse resultado do índice, podemos elencar os 10 principais nomes por esse resultado e compará-los contra os 10 principais nomes que contribuíram para o resultado do Ibovespa. Abaixo temos essa essa análise:
Fonte: B3 Índices, produção Nu Asset Management
Como veremos abaixo, o índice aumenta as alocações em ações de setores notoriamente pagadores de dividendos (Bancário e Utilidade Pública). O fato de ser um índice mais concentrado (com menos ativos) permite que mais retorno seja extraído de ações que apresentam bom desempenho (Banco do Brasil – BBAS3, por exemplo). Além disso, ao usar o critério de pagamento de dividendos investimos mais em ativos que, embora possuam menor capitalização de mercado, produzem bons retornos (Bradesco Participações – BRAP4, por exemplo).
Além do efeito de intensificação de aproveitamento dos ativos que produzem retornos positivos, aumentando a aposta nos ativos que produzem retornos positivos, o índice também é “Smart” ao evitar investir em ativos que contribuíram negativamente para o índice do Bovespa. Afinal, sabemos que uma boa carteira de investimentos deve evitar ao máximo grandes perdas que venham a interromper o processo de retornos compostos do índice.
Na tabela abaixo vemos que dentre os ativos que mais contribuíram negativamente para o Ibovespa apenas um deles (a OIBR4) retirou retorno do índice Bovespa Smart Dividendos. É a evidência concreta da busca por dividendos servindo para aumentar a exposição a ativos de qualidade. Muitos dos ativos do Ibovespa sequer participaram do índice Bovespa Smart Dividendos durante os 10 anos de backtest, ou seja, a metodologia do índice permite evitar ativos muito voláteis.
Fonte: B3 Índices, produção Nu Asset Management
Por fim, podemos analisar a evolução da carteira histórica de ambos os índices ao longo do tempo e notar a diferença de alocações e concentrações nos setores. O Ibovespa é fortemente concentrado em setores de Energia e Financeiro, ao passo que o Índice Bovespa Smart Dividendos é concentrado em Serviços de Utilidade Pública e Financeiro. Importante também notar a evolução das alocações setoriais ao longo do tempo, onde o índice vai alterando suas alocações na medida em que os ativos pertencentes a um setor passam a pagar mais dividendo que os demais.
Fonte: B3 Índices e Bloomberg, produção Nu Asset Management
Em conclusão, o conceito de smart beta se mostra muito eficaz ao explorar fatores específicos como os dividendos dentro de um índice de referência como o Ibovespa. A construção do índice Bovespa Smart Dividendos, que utiliza critérios de seleção e ponderação baseados em dividend yield e outros fatores, apresenta um desempenho superior ao Ibovespa, evidenciando a extração e aproveitamento desse fator ao longo do tempo. Essa abordagem proporciona uma otimização ao índice original, oferecendo aos investidores uma estratégia de investimento inteligente e consistente.
1Graham, B. and Dodd, D.L. (1951) Security Analysis. McGraw-Hill, New York.
2 Link história do Ibovespa
3Entende-se como prêmio de risco o retorno adicional à taxa livre de risco (taxa CDI) auferido pelo investidor, ou seja, o quanto ele é remunerado pela incerteza da renda variável.
5Implied Equity Risk Premiums on US stocks- 1960 – 2022
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